Ana,
Nós duas começamos juntas o desafio de 31 dias da yoga da Adriene sobre o qual você comentou na semana passada, mas eu abandonei o barco assim que fui interceptada por uma gripe ou vírus correlato, que deixou meu corpo sem disposição por uns três ou quatro dias. Depois que me restabeleci, apesar de não ter entrado novamente em nenhum desafio, mantive a prática quase todos os dias ao acordar.
Como você sabe, eu costumo me levantar antes das seis, quando o sol ainda não nasceu. Em seguida, caminho do quarto até a sala (nesse horário o Milu nunca me segue, preferindo continuar seu soninho na cama). Acendo a luz. Coloco meu tapete no chão em frente à tevê e seleciono uma aula conforme o tempo disponível e a vibe do momento. Ontem, pelo jeito, eu estava me sentindo bem, porque escolhi “Power and Balance - 30 minute Yoga Practice". Assim que abri o link, li o comentário escrito há dois meses que aparecia no topo da lista e tinha recebido mais de mil curtidas. O autor era o usuário bolverkvolsung6142, um soldado na Ucrânia. Ele se mostrava agradecido pelos vídeos do canal, que o ajudavam a aliviar o estresse, e terminava dizendo que considerava particularmente engraçado ouvir a Adriene recomendando um momentinho de paz enquanto a guerra rolava solta nas proximidades.
Eu jamais poderia ter imaginado que durante a minha rotina matinal um soldado talvez estivesse interrompendo momentaneamente os seus afazeres bélicos pra uma sessãozinha de yoga no Youtube. Mais do que isso: eu não imaginava que esse soldado pudesse se permitir uma pequena risadinha ao constatar a ironia de ouvir a Adriene falar de paz num cenário de campo de batalha.
Eu não sei se você conseguiu consertar ou trocar o seu umidificador, mas o meu, que resolveu quebrar justo no meio desse inverno quente e enfumaçado, ainda não foi substituído. Por sorte, dentro da minha casa continua razoavelmente agradável, porque aqui há um certo microclima (o que pode ser ruim no frio, mas é maravilhoso no calor). Sempre que preciso ir lá fora, no entanto, tenho uns ataques de tosse.
Mesmo com essa amostra grátis de apocalipse que estamos vivendo, eu venho tentando não pensar muito em catástrofes ambientais e em como estará o mundo daqui a vinte e cinco anos, porque tendo a ficar obcecada pelo assunto e, como resultado, muito ansiosa. A sensação de impotência em relação ao futuro pode ser meio desesperadora, mas a risadinha do bolverkvolsung6142 (que aconteceu, segundo minha imaginação, justo durante a postura do guerreiro II), me parece reconfortante. Reconfortante porque prova que há maneiras leves de enfrentar situações pesadas.
Também acho engraçado pensar em quantos empecilhos a gente inventa pra deixar de fazer coisas importantes pro próprio bem-estar. Normalmente, os nossos obstáculos - preguiça, ansiedade etc. - são meio abstratos. Os do bolverkvolsung6142 - artilharia pesada, explosões etc. - me parecem mais palpáveis. Não acho que faça sentido ficar hierarquizando dificuldades, mas é difícil conceber cenários menos propícios ao bem-estar do que uma guerra. Então decidi que sempre que tiver problemas com disciplina vou pensar no bolverkvolsung6142 fazendo yoga (difícil vai ser pronunciar o nome dele, ainda que mentalmente).
Por fim, essa coisa toda me fez recuperar da memória um post que publiquei no Instagram em 2016 sobre as manifestações que aconteceram aqui na Paulista depois do golpe contra a Dilma. Consegui achá-lo nos meus arquivos e aproveito pra colocá-lo aqui.
Sobre os filmes que você comentou ter assistido, eu vi o Folhas de Outono no cinema uns meses atrás. Considerando que a fotografia era bem bonita, que estava com uma amiga, que paguei meia no ingresso, que dei algumas risadas e que a pipoca estava gostosa, a experiência foi legal. Mas é como você pontuou: trata-se de um filme bastante finlandês. Risos. Sobre o Sybil, embora tenha me interessado pela sinopse, desconfio que jamais assistirei. O motivo: detestei Anatomia de uma queda e - talvez consequentemente - também a Sandra Hüller.
Nesta semana, posso recomendar um ótimo filme sessão da tarde, vibe meio podcast Mulher da casa abandonada, mas fofo e com humor britânico - que é meu preferido. Ele se chama A senhora da Van e é uma adaptação do mesmo livro que originou a peça que eu assisti no Sesc Pinheiros no domingo, junto com uma plateia 80% composta de nonagenários. Dá pra ver pelo Stremio. Aliás, falando em Stremio, assim que for possível eu passo aí pra instalar os add-ons no seu computador e abrir os portais da pirataria cinematográfica em sua vida.
Enquanto respiro um ar cuja umidade relativa é estimada atualmente em 2%, eu me despeço e desejo uma próxima semana menos poluída pra todos nós.
Beijos,
Gabi