Gabi,
O meio do ano está batendo em nossa porta e, por aqui, com ele vem a minha tradicional crise do “mulher, sustenta suas decisões”. Lá vem uma avalanche no trabalho, envolta em uma atmosfera de ansiedade por causa de indefinições nos projetos, que me bota pra baixo. Um cansaço pelo acúmulo das coisas do ano me deixa um pouco mais lenta, um pouco mais procrastinadora. Alguns “nãos” que preciso dizer, mas que tenho muito medo de me arrepender, me deixam angustiada. Quando percebo, estou cansadita, chorona e precisando muito de colo.
Sua última carta chegou em um dia em que eu estava especialmente frágil, e a lembrança daqueles domingos na padabosta (você lembra que era assim que chamávamos a padaria ruim?) me arrancou algumas lágrimas. Não foi pela recordação do pão de queijo ruim que chorei, foi um chorinho de alegria mesmo, sabe? Foi muito bom lembrar das conversas nos intervalos do pomodoro, do garçom que era apaixonadinho por você e às vezes nos dava docinhos (ruins) para tentar chamar sua atenção, do quão feliz eu ficava enquanto avançava na tradução daquele livro, dos seus desenhos… Acho que a gente é meio boa em encontrar um jeito de se apoiar, né?
Daquela época, também ficou o hábito de usar o método pomodoro para me ajudar quando a concentração está em frangalhos, e também continuo com a mania de planejar e dividir tudo o que tenho para fazer em blocos, listas e planilhas.
O tema da sua última carta foi rotina. Não sou alguém notável na fila do pão, mas também posso ostentar a minha muito bem estruturada (pra não dizer obsessiva): nos finais de semana, o tradicional bolinho de sono para descansar; nos dias de semana, um café da manhã caprichado, atividade física diária, uma casa organizada para eu me sentir bem, yoguinha, meditação… Todos os pilares que fui construindo na minha vida para me ajudar a aguentar firme. A meta é clara: encontrar o meio-termo entre não decepcionar o Sr. Hirayama e não viver como uma velhinha chata.
Acontece que, quando a avalanche vem, ela é braba. E sua carta me lembrou do que é principal para me encher de vida: minhas pessoinhas. Depois da sua carta, eu, bem metodicazinha, tracei uma nova rota e compartilho aqui uma lista (para não perder o costume) do que tenho feito para não deixar a peteca cair. Assim minha carta não acaba em tom de lamúria.
Criar coisas com as mãos: me joguei com tudo na costura e fiz uma saia e um moletom. Em um final de semana, me desafiei a todos os dias sair vestida com pelo menos uma peça feita por mim.
Sair mais para jantar com amigas. Nada como uma boa conversa, rir até a barriga doer e vinho.
Ir a shows.
Pausas no trabalho para desabafar (trabalhar com amigos é um grande privilégio).
Cochichos e risadas no cinema.
Cozinhar minhas comidas preferidas.
Brigadeiro na panela em noites frias.
Trocar memes para rir ao longo do dia.
Livros ou filmes antes de dormir.
Pedir e dar colo.
Não vou dizer que está fácil, mas digamos que está sendo possível atravessar os dias mais caóticos. Pelo menos tenho estado bem acompanhada e com um guarda-roupa feito por mim.


Beijos,
Ana
PS: na sua carta você falou em trabalharmos juntas de vez em quando e hoje você me disse que faria café e me trataria como uma princesa. Bom, diante de uma proposta dessa, que dizer além de que semana que vem vou organizar a agenda para garantir umas horinhas de trabalho com você aí no ateliê? Pode me esperar que vou aparecer.
Quem assina este texto é Ana Paula Girardi, editora de material didático, tradutora do espanhol e, às terças-feiras, também escritora.
Este texto faz parte da newsletter Cartas na Amoreira, um exercício quinzenal de escrita e de amizade publicado por Ana Paula e Gabriela. Para saber mais sobre as autoras e as cartas, clique aqui. Para assinar gratuitamente, clique no botão.
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Acho que todo mundo deveria ter uma lista das coisas que não podem faltar para não deixar a peteca cair ou coisas que simplesmente fazem o tempo parar quando estamos exaustas demais do que acontece dentro da nossa cabeça. A minha atual lista é:
1. Meditar
2. Sol
3. Tempo com filho gato
4. Qualquer leitura de ficção
5. Alguma leitura bruxística
6. Tempo com os meus personagens
7. Fazer journal e colagens
8. Desligar o celular às 20h30 da noite
Com a devida atenção, a lista sempre cumpre o seu propósito, não é mesmo? :)
Eu amo demais acompanhar as cartas de vocês 🫶🏽